4 de setembro de 2015

A vacina do bem

Quando se é criança, ou pelo menos assim eu pensava, o sentido da vida era conhecer o mundo. Tão vasto! Tantas coisas novas e fascinantes pra aprender, pra compreender, pra fazer parte. E eu fui conhecendo o mundo. Sabe aquela sensação de que tudo é melhor e mais belo quando a gente não conhece bem? Quando tem mistério? Então, a cada dia eu fui desvendando os dias em si. Não era tão belo como imaginei, e ainda assim era tão vasto. A cada novo dia, um pouco mais de conhecimento. Até que eu aprendi história e conheci o passado do mundo. Por que tantos conflitos? Por que tantos jogos? Poder? Por que essa dificuldade toda em miscigenar? Por que evoluímos na medicina, na tecnologia e na agricultura quase que exclusivamente por causa de guerras? Por que lutar pela sobrevivência em uma era tão inteligente? Parecia que não tinha mais fim a teia de histórias curiosas desse mundo...

E de repente uma avalanche de informações tomou conta dos dias. O mundo ficou bem menor. Passei a saber de coisas lá do outro lado do mundo sem nunca ter se quer imaginado sair da minha cidade, da minha casa. As notícias começaram a pular na minha frente sem eu ter que me debruçar em um livro pra ler de novo as palavras "guerra", "massacre", "desumano", "violência", "medo"... Muitas vezes na mesma manchete.

Percebi que as notícias não pularam na minha frente, elas já estavam ali. Sempre existiram. E eram algo pior: eram fatos. A essa altura era tarde demais pra esquecer o mundo. Não havia como deixar de conhecê-lo pois eu fazia parte dele. Posso abrir um espaço agora e descrever quantas coisas maravilhosas também vi e consegui viver. E, com certeza, a semelhança de todas estas experiências foi que somente o ser humano pôde ser o protagonista. Não posso falar pelo mundo, mas acredito que ele também concordaria. Não há nada mais incrível do que a humanidade e o seu poder de amar. Não somos os únicos que temos essa capacidade. A natureza inteira está aí pra provar que o amor envolve tudo. Mas nós podemos pensar, raciocinar, dialogar, convencer e proteger o que amamos. Tudo isso com o mínimo de esforço.

Então por que repetir diariamente a história do mundo? Por que causamos dor aos nossos iguais (e também aos nossos diferentes, oras)? Por que temos que nos proteger de nós mesmos? Por que temos grades para não sair e muros para não entrar? Por que, todo dia, nossa comida sobra e vai para o lixo? Os fatos estão aí, todo dia, no mundo inteiro e nunca mudaram.

Talvez seja alguma coisa no nosso cérebro, no cérebro tão racional dos humanos. Mas justo com a gente! Justo a gente conseguir mentir, machucar sem motivos e se satisfazer com isso. Ou às vezes só não se importar mesmo. Qual será o gene modificado? Qual será a doença que carregamos que encobre tantas vezes o amor?

Talvez nunca exista, mas a vacina ideal seria aquela que faria alguém olhar para um outro ser humano e se refletir nele. E que, ao fazer isso, não tivesse vontade de machucá-lo, oprimi-lo, escravizá-lo ou estuprá-lo. Que não desejasse vê-lo sozinho, sofrendo, faminto ou com medo. Que não quisesse tirar-lhe a vida, a família, os bens ou a terra.

Uma vacina nada mais é do que um pedacinho do vírus dentro da gente que faz as coisas mudarem de lado e acaba virando o antídoto. O vírus nós já temos há muito tempo, um pouquinho em cada um de nós. O antídoto pode estar sendo espalhado por algumas pessoas no mundo. Essa é a minha esperança. Algumas delas talvez ainda nem conheçam o mundo como eu e você conhecemos. Sorte delas. Sorte nossa.

2 comentários:

  1. Poxa vida, que gostoso ler isso. Parabénxxxx e obrigado, Monique!

    PS: tem um botão aqui embaixo para comentar dizendo "Eu não sou um robô"

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